Por Jorge F. Negrete P.
“De noite, especialmente, é lindo acreditar na luz” (Platão)
O direito de acesso à internet, às TICs, aos serviços de telecomunicações e à banda larga é um direito capacitador que se transforma na ferramenta pela qual o mundo digital se abre para o exercício dos direitos fundamentais. Quais? Todos. Absolutamente todos.
O buraco negro que tudo devora ao torná-lo digital se transforma no aliado mais poderoso para o exercício dos direitos humanos nesta dimensão. Algo que eu denominei “Constitucionalismo Digital”. A cultura é um desses direitos, assim como todas as suas formas de criação, recepção e gestão.
Ao permitir o direito de acesso à cultura, a racionalidade da política pública muda e nasce um conceito que denomino “política digital para a cultura”.
A política digital para a cultura se aproxima de todas as formas de preservação, expressão, distribuição e consumo da cultura; torna-se uma ferramenta que pode ser vital para facilitar o desenvolvimento dessas atividades.
Na busca e construção de novas políticas públicas, é vital conhecer as capacidades das novas gerações tecnológicas, tanto em redes e conectividade quanto em tecnologia digital. Refiro-me à internet das coisas (IoT), à análise de dados e à inteligência artificial (IA).
O formulador de políticas culturais deve compreender que a tecnologia digital criou uma série de novos paradigmas e externalidades excepcionais. Aqui estão algumas delas:
Tudo pode ser digitalizado, incluindo a própria realidade no metaverso. Isso permite trabalhar na preservação do patrimônio material e imaterial, de zonas arqueológicas completas, expressões e línguas em perigo de extinção, assim como fonogramas e patrimônio audiovisual de diversas origens.
A era do acesso: o conceito de propriedade no âmbito cultural está em transição. Emergiu a era do acesso. A era do produto editorial está sendo substituída pela do conteúdo e seu acesso online. Fundos de catálogos de propriedade intelectual estão adotando formatos e modelos de comunicação inovadores, como as plataformas de vídeo, música e livros. Nos acostumamos com marcas como Netflix, Vudu, Hulu, Disney+, HBO+, Star+, Spotify, Tidal e Kindle, entre outras.
O valor que essas plataformas estão proporcionando para a preservação da cultura sonora, audiovisual e editorial é inestimável. O acesso online, de maneira dinâmica e fluida, tem facilitado o acesso aos consumos culturais.
Revistas, peças de teatro, concertos de música popular ou sinfônica, e festividades populares massificam a comunicação cultural, constroem novas audiências e fortalecem a preservação do patrimônio cultural imaterial e coletivo.
Hoje podemos conceber e imaginar os primeiros museus, cidades com vocação cultural e zonas arqueológicas 5G, onde se recebe o turista cultural com infraestrutura digital que compreende pagamento digital, sistema de guia em vários idiomas, vídeos, realidade aumentada, realidade virtual, rota de visita eficiente e que preserva o patrimônio cultural, acesso a informações adicionais online, perfil de usuário, acesso a estatísticas para marketing cultural e preservação do local.
O acesso à internet facilita a resolução da dicotomia entre cultura e desenvolvimento. Essa dicotomia não deve estar em contradição, com base no raciocínio constitucional da indivisibilidade dos direitos fundamentais; de fato, não poderia ser de outra forma.
A cultura, entendida como um recurso (Georges Yúdice, 2002), encontra seu equivalente no conceito: o recurso digital.
Esta semana, em Portugal, está ocorrendo o Congresso Ibero-americano de Cultura. Um dos temas em discussão? A relação entre cultura e tecnologia digital. Nada mais apaixonante para debater neste contexto ibero-americano, que se define por sua diversidade e aspirações de igualdade digital.
Presidente de Política e Lei Digital
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